O cabeça de dinamite
Uma troca de “farpas” que aqui houve no blog há uns tempos motivou-me para ler um filósofo que me escapou da interminável lista de livros que tenho marcada para (quem sabe…um dia…) ler.
Estou a falar de Friedrich Nietzsche (homem que mete medo só pelo nome) mas que tenho pena de não ter estudado para (o) perceber melhor. De qualquer forma, os seus livros são um verdadeiro prazer de ler. O seu estilo faz-me lembrar Eça (se bem que não tão bom – nem o tradutor conseguiria): o tipo de frase, o humor subtil, a ridicularização (se bem que no caso de Eça eram as personagens criadas por ele).
Li 2 livros (o que é manifestamente insuficiente, mas…), fiquei com vontade de ler 20. Comecei pelo “Anticristo” e avancei para “O Crepúsculo dos Ídolos”. O primeiro é sem tirar nem pôr aquilo que penso acerca da religião católica; o segundo parece-me um pouco exagerado – divertido, mas exagerado (o que não o impede de ser brilhante).
Não sou ninguém para fazer análises das obras de Nietzsche. Percebi toda a sua repugnância (bem fundamentada) ao chamado sacerdote, a sua visão do cristianismo como religião de bárbaros, enfim, uma mensagem simples e demolidora: a humanidade anda e andou a enganar-se com o cristianismo – deturpado desde a sua raíz; e o que choca, sobretudo, é que a forma como anda não mudou desde o séc. XIX. Como existencialista e humanista que é, Nietzsche não concebe sequer outra forma de perceber o mundo do que por ele próprio – não há nada “above”; isto provoca-lhe uma certa irritação – o porquê de o homem não poder ter a salvação neste mundo.
No livro de que já falei, “O Crepúsculo dos Ídolos”, temos uma crítica a três filósofos que tive a sorte de estudar (possivelmente a mais, mas estes foram os que me ficaram na cabeça): Platão, discípulo de Sócrates (cuja filosofia nos é dada a conhecer pelo discípulo do filósofo) e Kant. Estes primeiros são pilares do pensamento antigo, como toda a gente sabe; é talvez essa a característica de que Nietzsche se serve para, basicamente, os humilhar ("Derrubar ídolos - isso sim, já faz parte de meu ofício"). Sócrates não entende nada de moral, Platão não entende nada de moral e Kant entende-a de maneira errada, porque a forma como entende nunca fará o homem feliz. Certamente conhecem “a acção boa em si mesma”, a base de toda a moral kantiana - para Nietzsche, um tremendo erro. Como é que se pode pedir, por exemplo, a um operário, que se sinta realizado com o seu trabalho, se não o fizer tendo em vista o fim de ser bem remunerado, de ter dinheiro para pagar as suas despesas? Não há duvida, Nietzsche tem razão: a moral de Kant é impraticável…
Por outro lado, há um substratum de ideias pouco modernas…A recusa à democracia e ao socialismo provam-no… Para além disso, a escrita de Nietzsche, um pouco violenta até, serviu certamente de inspiração ao tio Adolf; pelo menos no anti-semitismo: despropositado, descabido, exagerado. Bem, mas isso é Nietzsche…
Estou a falar de Friedrich Nietzsche (homem que mete medo só pelo nome) mas que tenho pena de não ter estudado para (o) perceber melhor. De qualquer forma, os seus livros são um verdadeiro prazer de ler. O seu estilo faz-me lembrar Eça (se bem que não tão bom – nem o tradutor conseguiria): o tipo de frase, o humor subtil, a ridicularização (se bem que no caso de Eça eram as personagens criadas por ele).
Li 2 livros (o que é manifestamente insuficiente, mas…), fiquei com vontade de ler 20. Comecei pelo “Anticristo” e avancei para “O Crepúsculo dos Ídolos”. O primeiro é sem tirar nem pôr aquilo que penso acerca da religião católica; o segundo parece-me um pouco exagerado – divertido, mas exagerado (o que não o impede de ser brilhante).
Não sou ninguém para fazer análises das obras de Nietzsche. Percebi toda a sua repugnância (bem fundamentada) ao chamado sacerdote, a sua visão do cristianismo como religião de bárbaros, enfim, uma mensagem simples e demolidora: a humanidade anda e andou a enganar-se com o cristianismo – deturpado desde a sua raíz; e o que choca, sobretudo, é que a forma como anda não mudou desde o séc. XIX. Como existencialista e humanista que é, Nietzsche não concebe sequer outra forma de perceber o mundo do que por ele próprio – não há nada “above”; isto provoca-lhe uma certa irritação – o porquê de o homem não poder ter a salvação neste mundo.
No livro de que já falei, “O Crepúsculo dos Ídolos”, temos uma crítica a três filósofos que tive a sorte de estudar (possivelmente a mais, mas estes foram os que me ficaram na cabeça): Platão, discípulo de Sócrates (cuja filosofia nos é dada a conhecer pelo discípulo do filósofo) e Kant. Estes primeiros são pilares do pensamento antigo, como toda a gente sabe; é talvez essa a característica de que Nietzsche se serve para, basicamente, os humilhar ("Derrubar ídolos - isso sim, já faz parte de meu ofício"). Sócrates não entende nada de moral, Platão não entende nada de moral e Kant entende-a de maneira errada, porque a forma como entende nunca fará o homem feliz. Certamente conhecem “a acção boa em si mesma”, a base de toda a moral kantiana - para Nietzsche, um tremendo erro. Como é que se pode pedir, por exemplo, a um operário, que se sinta realizado com o seu trabalho, se não o fizer tendo em vista o fim de ser bem remunerado, de ter dinheiro para pagar as suas despesas? Não há duvida, Nietzsche tem razão: a moral de Kant é impraticável…
Por outro lado, há um substratum de ideias pouco modernas…A recusa à democracia e ao socialismo provam-no… Para além disso, a escrita de Nietzsche, um pouco violenta até, serviu certamente de inspiração ao tio Adolf; pelo menos no anti-semitismo: despropositado, descabido, exagerado. Bem, mas isso é Nietzsche…
Aconselho-te a ler agora o Assim Falava Zaratustra. A influência a Hitler que falas, julgo eu que será pelo imaginário Super-Homem que foi mal-interpretado. As pessoas pensaram que Niezsche defendia a superioridade do Homem através do sentido racial. Coisa q entre outros, o nazismo se apropriou desta ideia deturpada.O Super-Homem do Niezsche é o homem que se eleva acima da moral cristã (e platónica) de forma a apreciar a vida como ela merece ser apreciada. O Super-Homem é a transcendência dos valores do homem ocidental, que supera o niilismo e que no fundo descobre o sentido de viver. Nevertheless, lê o Assim Falava Zaratustra, não te arrependes. ;)
E sim, o homem é genial.
Posted by Alexandre Carvalho | 16/7/05 3:09 da tarde
Cheira-me que o Nazismo se aproveitou de muito mais coisas, entre elas o ódio ao povo judeu...
No início de cada livro há umas passagens do "Assim Falava Zaratustra"...Quando puder irei, certamente, dar uma olhada...
Posted by António Pedro | 18/7/05 5:07 da manhã
Eu falei do Zaratustra pq é o livro que se vai de encontro ao que tu falaste na tua análise - se bem que eu ache que estamos longe de poder considerar Nietzsche um humanista. Eu agora que tou de férias, tb tou a aproveitar para redescobri-lo (como se pode ver pelo meu blog), e decidi começar com o Humano, Demasiado Humano : um livro para espíritos livres e também não me pareceu nada ser uma obra a ignorar ;)
Posted by Alexandre Carvalho | 19/7/05 4:27 da manhã
Bem, Alexandre, até poderíamos iniciar aqui uma dessas intermináveis discussões, em que o próximo post seria qualquer coisa com o dobro das palavras e metade do conteúdo.
Mas como penso ter já explanado sobejas vezes o que penso destas discussões, limito-me à minha estreiteza de horizontes (como aliás, já tinha aqui dito uma vez).
Se considerarmos um humanista como alguém que preconiza uma doutrina centrada nos valores humanos e na sua defesa, Nietzsche é, efectivamente, um humanista. Se considerarmos as dezenas de acepções que o termo tem vindo a adquirir, pode simultaneamente não ser. E por falar em não ser, foi para não cair no niilismo que afirmou muito do que afirmou (conheces as suas obras, não vou ter que te citar).
E se lhe seguíssemos o exemplo?
Posted by António Pedro | 19/7/05 5:17 da manhã
o "sobejas" era excusado...recorda-me certas pessoas que, enfim...
e desde quando o niilismo é mau? Mas pronto, termino por aqui, não quero também começar "picanços" que não levam a lado nenhum*
Posted by Alice | 19/7/05 3:01 da tarde
Bem, Alice, lamento dizer-te que falhaste duplamente a interpretação do comment: em primeiro, porque o "sobejamente" em itálico era precisamente para realçar esse vocábulo com que tantas vezes fomos azucrinados; em segunda, Nietzsche criticava o niilismo e, a meu ver, com muita razão naquilo que diz. Soa-me a pretensiosismo explicar-te a crítica ao niilismo feita por Nietzsche quer na "Genealogia da Moral", quer no "Crepúsculo dos Ídolos". Se leres qualquer um deles, certamente que irás entender.
E não, Alice. Estas demonstrações de boa (ou má) retórica não levam a lado rigorosamente nenhum. É a minha opinião...And so what?
Posted by António Pedro | 19/7/05 9:45 da tarde
bem, eu quando falava em niilismo, nao me referia à visão de Nietzsche sobre este, mas sim à minha. (sim, e eu precebi o "sobejas")
Posted by Alice | 19/7/05 9:55 da tarde