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Skins, Neonazis, Música e Futebol


António Salas não existe. E, como ele, também a personagem Tiger88, criada por ele, não existe. O primeiro pseudónimo serve para lhe proteger a identidade. O segundo serviu para se infiltrar no movimento neonazi espanhol. Começou em chats e acabou como colaborador para inúmeros fanzines de extrema-direita, membro da claque do Real Madrid “Ultrassur”, companheiro de cenas de violência contra imigrantes e adeptos de outras claques e de tertúlias onde se debatem temas como o sucessor do Führer ou o poder do sionismo no mundo ocidental.

Mas tudo isto peca pela sua previsibilidade. Não é preciso estar infiltrado num movimento neonazi para se saber que, muito provavelmente, serão estas as suas actividades. E é aqui que está o mérito do trabalho de António Salas: ter descoberto e registado (o jornalista muniu-se durante todo o tempo em que esteve infiltrado – cerca de um ano – de uma câmara de filmar, que escondeu no casaco e que lhe permitiu gravar desde interiores de bares frequentados quase que exclusivamente por skins a cenas de espancamento de adeptos de claques rivais) informações impossíveis de adivinhar de outro modo, como, por exemplo, o financiamento atribuído por dirigentes desportivos a claques que, fora do Estádio, mais do que provocar distúrbios, agridem adeptos de outros clubes. Claques essas constituídas por skins, muitos deles cadastrados e incapazes de esconder o ódio (“(...) O ódio. Um ódio irracional, absurdo e irrefreável, que nos embargava a todos...”) que sentem por imigrantes, mendigos, prostituas, homossexuais, que consideram serem a corja da sociedade (“(...) 23 de Junho de 1998. Quatro jovens skinheads, entre os dezassete e os vinte anos, regaram com gasolina um mendigo enquanto dormia, numa rua da Corunha, e deitaram-lhe fogo...”).

“Diário de um skin” é um completo tratado sobre o movimento neonazi, não só espanhol, como mundial. Está repleto de informações sobre aqueles que alimentam ideologicamente o movimento (e que segundo o próprio autor manipulam e se aproveitam, em muitos casos, da devoção e ingenuidade destes militantes), bandas que animam as manifestações e concertos em que estes grupos participam (com nomes e letras tão sugestivas como “Estirpe Imperial” (”Guerra nas ruas. O asfalto tinge-se de vermelho outra vez. / Sai à rua e recorda, morrer ou vencer) ou “Tropa SS”), vídeos sugestivos com títulos como Lucrecia jódete (em alusão à imigrante dominicana Lucrecia Pérez, assassinada em 13 de Novembro de 1992 por um guarda civil neonazi), ligações de movimentos de extrema-direita ao Islão, por serem, alegadamente, aliados no “combate ao sionismo” (o atentado terrorista de 11 de Setembro dividiu a comunidade skin nos EUA: de um lado ficaram os que perderam familiares e amigos, e que, obviamente, repudiaram o atentado; de outro ficaram os que aplaudiram o atentado por ter acabado com um dos grandes centros económicos controlados por judeus), centros de investigação e divulgação da ideologia neonazi, como o Círculo de Estudos Indo-Europeus em Espanha, esoterismos e ocultismos entre a comunidade skin (o autor descreve acampamentos e rituais dignos de figurar numa produção hollywoodesca, em que se incendeiam cruzes e se fazem juramentos), entre uma infinidade de outros dados que recolheu enquanto infiltrado. Como afirma o próprio autor: “a informação que recolhi dava para escrever não um, mas dez livros sobre o movimento neonazi”.

Para concluir, e sem adiantar muito mais sobre este livro que se aconselha a toda a gente que queira saber um pouco mais sobre a história do movimento skin na Europa (surgido – desconhecia completamente – no seio do movimento punk britânico) ou sobre a própria dimensão da ideologia nacional-socialista no mundo ocidental, em pleno séc. XXI, deixo um parágrafo sobre “a outra face da moeda”. Para quem ainda acredite que os movimentos de extrema-esquerda são mais puros ou menos violentos: “(...) Mas também me irrita que a extrema-esquerda procure instrumentalizá-la [a hipocrisia dos ideólogos neonazis ao negarem o seu envolvimento com integralistas islâmicos] (...) e depois de se desfazer em elogios ao meu trabalho, procure utilizá-lo para demonstrar como vocês [skins] são maus e eles bons. Como se a extrema-esquerda tivesse algo a apontar à extrema-direita. Calculo que se soubessem que enquanto trabalhei na minha investigação entre anarquistas, okupas, SHARPS (Skin Heads Against Racial Prejudice), red-skins e restantes radicais de esquerda, cheguei a gravar com a minha câmara oculta terroristas bascos descrevendo os seus atentados, não tentariam manipular-me a mim também. Ao fim e ao cabo, fascistas e antifascistas são extremos que se tocam a partir do momento em que radicalizam os seus métodos e as suas ideias...”. Resta acrescentar que também os skins de extrema-esquerda têm ligações ao futebol (se não estou em erro, a claque do Osasuna de Navarra é uma delas). Depois de lerem o livro, só têm de tirar as vossas conclusões. Está tudo lá. E o pior é que estamos a falar de factos.

Bom texto! So achei que anti-fascista é um termo demasiado abrangente para estar ligado a um "extremismo". Acho que anti-fascista ainda não implica ser nada mais.

Já agora, há movimentos de extrema esquerda baseados no pacifismo e na ecologia, só não são é mediáticos.

A maior parte dos grupos radicais de esquerda são conhecidos como "anti-fascistas" - antifas, para ser mais preciso. Claro que se pode, perfeitamente, ser anti-fascista e não pertencer a nenhum grupo radical de esquerda (penso que a maior parte destas pessoas se incluirão nesta categoria, lol). Acho que devia ter usado mesmo a "alcunha"... Não que o autor do livro o tenha feito, no entanto. Refere-se mesmo a eles aleatoriamente como "antifas" ou "anti-fascistas"...

Estive a folhear ontem o livro na FNAC, acho que não me vai escapar como leitura de férias ;-)

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