"The Big Fish" - Quem conta um conto...
a mesa de cafe
É feriado, está tudo em casa a estudar para os testes (para os últimos, ao menos isso) e eu estou aqui sentado, depois de acabar de ver um dos filmes que estava na minha lista de filmes prioritários - “The Big Fish” (ou em português “O Grande Peixe” _ não é nenhuma pretensão mas acho que muitas vezes os títulos dos filmes não deviam ser traduzidos, para nos pouparem a coisas do género “O Amor é Um Lugar Estranho”, e etc._).
Não será exagerado dizer que este é um filme fora do comum. Na verdade, é mesmo esse o tema do filme: “o fora do comum”. Edward Bloom é um homem adorado por toda a gente, pela sua erudição, pelas suas histórias (fantasiadas ou não), ou pela forma como insiste em que elas perdurem, coisa que não agrada muito ao seu filho William, que descobre, alguns anos mais tarde, que simplesmente não conhece o seu pai. Descobre que aquilo que sabe sobre ele é nulo, porque se limitou, parte da sua vida, a acreditar naquilo que este lhe contava, sobre vilas de gente que anda descalça, sobre gigantes e gémeas siamesas, descobre que ao juntar tudo, a única coisa que conclui é que o universo fantasioso do pai é o culpado pelo desconhecimento que tem deste, e é provavelmente a única coisa que realmente sobre o pai. No dia em que anuncia o seu casamento, William corta relações com este, por estar farto do protagonismo que o pai insiste em ter em todas as reuniões familiares, e que se deve somente às suas histórias integralmente inventadas ou meramente exageradas. Recusa-se a falar com o pai durante 3 anos, até ao dia em que o vê adoecer e que sente iniciar-se o sentimento de necessidade de descobrir a verdade sobre o pai, de descortinar todo o mundo imaginário de Edward Bloom e realmente saber o que está por trás desse pai e desse homem.
Mas o tema do filme está longe de se esgotar nesta acção central. Constitui, a meu ver, um retrato engraçado daquelas pessoas que estamos habituados a ouvir contar histórias, a fabularem para uma roda de pessoas, a acreditarem mesmo naquilo que contam. Penso que toda a gente conhece, pelo menos, umas duas ou três pessoas deste género: seja um amigo, um parente afastado, um professor…e que se formos bem a ver, este exagero não é mais do que, por vezes, uma necessidade enorme de evasão do mundo mecânico e rotineiro que é o nosso. Ou então uma igual necessidade, mas desta vez, de ilusão, para não serem obrigadas a ver o mundo monótono e sombrio que está à frente delas. E, no fundo, quem é que não as gosta de ouvir? São capazes de entreter um grupo de amigos durante horas e horas, de o fazer rir, enfim…a único aspecto negativo é a forma como ficam ofendidos face ao nosso olhar de desconfiança, que, no meu caso, é uma certeza.
“The Big Fish” é um filme que joga muito com a dualidade fantasia/realidade, dualidade essa que permite a introdução de cenas que são unicamente a interpretação dramática das histórias de Edward Bloom. Posso também dizer que é um daqueles filmes que temos dificuldade em gostar até ao final (não no meu caso, por mo terem contado sem querer), mas que depois nos deixa perplexos com a qualidade do filme. Um dos exemplos que me ocorre é “O Jogo” (com este não se puseram a inventar), que nos prende de uma maneira indescritível (deu-me vontade de desligar a televisão, aí uns 2 minutos antes do filme acabar, e de ir contar a toda a gente a trampa que tinha acabado de ver, mas ainda bem que não o fiz porque certamente iria fazer figura de estúpido) até quase ao final do filme, e que nos últimos momentos altera (na minha opinão) completamente a nossa opinião sobre este.
Para concluir, apenas quero recomendar a todos que o vejam. E para os que já o viram, que deixem aqui a sua opinião.
É feriado, está tudo em casa a estudar para os testes (para os últimos, ao menos isso) e eu estou aqui sentado, depois de acabar de ver um dos filmes que estava na minha lista de filmes prioritários - “The Big Fish” (ou em português “O Grande Peixe” _ não é nenhuma pretensão mas acho que muitas vezes os títulos dos filmes não deviam ser traduzidos, para nos pouparem a coisas do género “O Amor é Um Lugar Estranho”, e etc._).
Não será exagerado dizer que este é um filme fora do comum. Na verdade, é mesmo esse o tema do filme: “o fora do comum”. Edward Bloom é um homem adorado por toda a gente, pela sua erudição, pelas suas histórias (fantasiadas ou não), ou pela forma como insiste em que elas perdurem, coisa que não agrada muito ao seu filho William, que descobre, alguns anos mais tarde, que simplesmente não conhece o seu pai. Descobre que aquilo que sabe sobre ele é nulo, porque se limitou, parte da sua vida, a acreditar naquilo que este lhe contava, sobre vilas de gente que anda descalça, sobre gigantes e gémeas siamesas, descobre que ao juntar tudo, a única coisa que conclui é que o universo fantasioso do pai é o culpado pelo desconhecimento que tem deste, e é provavelmente a única coisa que realmente sobre o pai. No dia em que anuncia o seu casamento, William corta relações com este, por estar farto do protagonismo que o pai insiste em ter em todas as reuniões familiares, e que se deve somente às suas histórias integralmente inventadas ou meramente exageradas. Recusa-se a falar com o pai durante 3 anos, até ao dia em que o vê adoecer e que sente iniciar-se o sentimento de necessidade de descobrir a verdade sobre o pai, de descortinar todo o mundo imaginário de Edward Bloom e realmente saber o que está por trás desse pai e desse homem.
Mas o tema do filme está longe de se esgotar nesta acção central. Constitui, a meu ver, um retrato engraçado daquelas pessoas que estamos habituados a ouvir contar histórias, a fabularem para uma roda de pessoas, a acreditarem mesmo naquilo que contam. Penso que toda a gente conhece, pelo menos, umas duas ou três pessoas deste género: seja um amigo, um parente afastado, um professor…e que se formos bem a ver, este exagero não é mais do que, por vezes, uma necessidade enorme de evasão do mundo mecânico e rotineiro que é o nosso. Ou então uma igual necessidade, mas desta vez, de ilusão, para não serem obrigadas a ver o mundo monótono e sombrio que está à frente delas. E, no fundo, quem é que não as gosta de ouvir? São capazes de entreter um grupo de amigos durante horas e horas, de o fazer rir, enfim…a único aspecto negativo é a forma como ficam ofendidos face ao nosso olhar de desconfiança, que, no meu caso, é uma certeza.
“The Big Fish” é um filme que joga muito com a dualidade fantasia/realidade, dualidade essa que permite a introdução de cenas que são unicamente a interpretação dramática das histórias de Edward Bloom. Posso também dizer que é um daqueles filmes que temos dificuldade em gostar até ao final (não no meu caso, por mo terem contado sem querer), mas que depois nos deixa perplexos com a qualidade do filme. Um dos exemplos que me ocorre é “O Jogo” (com este não se puseram a inventar), que nos prende de uma maneira indescritível (deu-me vontade de desligar a televisão, aí uns 2 minutos antes do filme acabar, e de ir contar a toda a gente a trampa que tinha acabado de ver, mas ainda bem que não o fiz porque certamente iria fazer figura de estúpido) até quase ao final do filme, e que nos últimos momentos altera (na minha opinão) completamente a nossa opinião sobre este.
Para concluir, apenas quero recomendar a todos que o vejam. E para os que já o viram, que deixem aqui a sua opinião.
O Big Fish é realmente um bom filme, pelo menos refrescante no tema e na abordagem. Apesar de existir no cinema americano uma certa tradição desse tipo de personagens bigger than life (Edward Bloom) a verdade é que tem neste filme uma ambiguidade e uma dinâmica fora do vulgar. E resiste sempre à tentação de um twist final que remeta totalmente para uma dimensão (a da fantasia ou a da realidade).
Mas, justiça seja feita, O Jogo é um filme seminal, a milhas de Big Fish. Não tem comparação... joga noutro campeonato. Sempre tive um fraquinho pelo David Fincher.
(Aqueles planos em movimento no Panic Room são de uma pessoa ir às lágrimas)
Posted by João | 27/5/05 1:11 da tarde
"O Jogo" está longe de estar a milhas do "The Big Fish", e o "Panic Room" está por sua vez longe de qualquer um dos anteriores, porque não é diferente - é mau em sim mesmo.
A tradição das personagens "bigger than life" não existe só no cinema americano; existe em qualquer um _ porque são essas personagens que fazem com que um filme fique para a posteridade_; citando um exemplo mais corrente, posso falar de Amelie Poulain ou até dos travestis de Almodovar. Todas elas são, de facto, maiores que a vida. Quanto à relação de analogia que estabeleci entre o "The Big Fish" e "O Jogo", posso dizer que esta consiste única e exclusivamente no final inesperado de cada um deles; não são semelhantes em rigorosamente mais nada. Como tu próprio disseste, são filmes que jogam em diferentes campeonatos, e parece-me um pouco precipitada a atribuição redentora do estar a milhas. São filmes totalmente diferentes. Em tudo. Menos no final (só por ser inesperado, claro).
Posted by António Pedro | 27/5/05 2:42 da tarde
Ah... é nestas alturas que me apetece mandar para um certo sítio o inventor daquela frase "Gostos não se discutem". Não há nada que dê mais gosto discutir do que... gostos.
E neste caso agarro-me aos meus gostos, de mão na anca e vozinha de peixeira. O Jogo é muito melhor do que o Big Fish. E devo dizer que não concordo com essa noção de que os filmes (ou outras expressões artísticas, suponho) não são comparáveis por pertencerem a géneros e registos diferentes. Apesar de ser um conceito que tem, obviamente, os seus argumentos e que até poderá dar uma discussão interessante.
Quanto à questão das personagens bigger than life eu estava a referir-me mais aquela tradição insuportavel de uma certa personagem tipo do cinema americano. O homem/mulher que se transcende a si próprio e ás suas limitações para alcançar a realização pessoal. Enfim, a caminhada penosa e lacrimejante até se tornarem genuínos winners. Veja-se sobre este tema os case study que são os abomináveis "Erin Brokovich" ou "Uma Mente Brilhante". "Big Fish" foge a essa tradição com uma elegância que só merece elogios.
(Epah... revê o Panic Room, cagando para as fragilidades do argumento e para alguns momentos em que falha na tensão do huis clos. Foca só a realização. Os planos. Ninguém me apoia na opinião que aqueles planos mereciam um Óscar para melhor realizador?)
Posted by João | 28/5/05 11:33 da tarde
Aproveito o teu trocadilho para formar um outro: “Gostos discutem-se, mas não se impõem”…Como tal, é perfeitamente legitimo que aches o que bem te apetecer daquilo que eu gosto, tal como me é igualmente legítimo não gostar daquilo que tu gostas. Que bom, vivemos em democracia! E começando pelo fim, desculpa mas eu considero o “Panic Room” simplesmente…mau. É como um texto muito bem elaborado…de uma vacuidade que destrona todos os efeitos produzidos pela erudição e ornamentação linguísticas; no caso da “Sala de Pânico” (ainda bem que também não inventaram neste) passa-se exactamente o mesmo – pode até ser bem filmado, e ter uma fotografia engraçada…Mas a acção é simplesmente para…rir. Mas já que falas em tradições (eu preferiria chamar-lhes clichets) no cinema americano, gostaria de salientar uma que enerva bem mais do que qualquer outra: a capacidade que o inimigo tem de lhe acontecer tudo, desde levar com machados até cair das escadas e ficar até ao final para contar a história. Essa sim, parece-me uma tradição bem mais insuportável, mesmo que seja filmada de 200 planos. Mas como já disse, gostos são gostos…
E sim, João, são comparáveis, mas não da forma simplista que insistes em imprimir à dita comparação. Não se trata de serem melhores ou piores; agora sim, simplificando, trata-se de serem diferentes. Totalmente. Quanto à mão na anca, preferia guardar essa técnica de expressão dramática para discussões de diferente nível cultural/intelectual, como o preço do peixe (sim, foi uma frase pretensiosa), ou as medidas do Sócrates, tendo como pano de fundo uma banca cheia de carapau graúdo.
Também continuo sem perceber essa enumeração de filmes totalmente, e repito, diferentes (próximos, talvez, por essa característica do cinema _não do cinema americano, mas de todo o cinema), visto que a meu ver são filmes bastante bons (apesar de o serem como filmes, não como boas biografias _refiro-me mais a “Uma Mente Brilhante”_), e que sofrem única e exclusivamente pela irritante infelicidade de serem julgados por uma boa fatia de espectadores anti-clichets, tão anti-clichets que acabam elas mesmas por se transformarem em clichets (o que leva, em alguns casos, a uma profunda angustia existencial, que vem à tona normalmente na meia-idade).
Posted by António Pedro | 29/5/05 4:22 da manhã